segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Crítica de Carlos A. Hang a Variações Freudianas 1


VARIAÇÕES FREUDIANAS 1: O SINTOMA

Análise crítica
por

Carlos Alberto HANG

Se a consolidação da arte teatral se deu na Grécia Antiga como forma de homenagear ao deus do vinho, Dionisio, que é o equivalente ao deus romano Baco, não poderia ter sido em local diferente o lançamento internacional da peça Variações Freudianas 1: O Sintoma, em Roma. E se temos uma cidade que é palco do maior festival de dança do mundo, uma das artes mais expressivas do corpo e da alma humana e ainda se temos um espaço de espetáculos que é batizado com o nome de um dos artistas mais consagrados internacionalmente pela sua expressividade contemporânea, a maior cidade de Santa Catarina, Joinville, e seu tradicional Teatro Juarez Machado, certeiramente foi escolhido como palco do lançamento nacional desta peça teatral, a qual vai além do campo dinâmico das artes cênicas, tocando e sendo tocado pela psique humana em sua forma constitutiva. Lançada internacionalmente e nacionalmente, Variações Freudianas 1: O Sintoma precisa ser assistida e incorporada pelo público, o qual deixa seu papel primário de mero espectador, para ser 1 com o espetáculo.


O sintoma, feito a Esfinge, amaldiçoa a criatura que se o faz detentor, decifrando-a ou devorando-a pouco a pouco nas margens periféricas e sombrias da mente humana. O Sintoma, impulsionado pelo recalcado e pelos elementos expurgados pelo dito das conveniências normativas do ser enquanto ser carente de si mesmo, representa o retorno do real, onde o não-dito se encontra vociferando com a força de um colossal. Freud localiza no sintoma a ação entre as representações recalcadas do desejo inconsciente e as exigências defensivas, a realização de uma fantasia de conteúdo sexual originárias das pulsões, sejam elas perversas, normais ou de caráter parcial. E graças demos a psicanálise, contradizendo o modelo cartesiano empregnado nas ciências médicas, pois ela não quer a eliminação do sintoma, mas a ele ser apresentada. Lacan vê no sintoma um significante do significado recalcado da consciência do sujeito, sendo assim, de acesso não possível de ocorrer por sua natureza peculiar. O sintoma, uma verdade que não tem irmandade gêmea com a significação em si mesma, deve ter sua manifestação permitida e, acolhida, como seta sinalizadora entre uma ação hic et nunc e outra que atua em reiterada contumásia.


O Diretor: numa relação simbiótica dramatúrgica entre o nomear textualmente e o atuar, encontra-se o homem, o ser, a extensão de si mesmo e do mundo, de seu mundo, de nosso mundo, de nós mesmos. É ele, que dispensa apresentações pois se apresente diante de sua obra viva, vivida e vivenciada e aplaudida. Com um texto que não nega o ontem, mas não deixa de persuadir a uma leitura sub specie aeternitatis.


A atriz: no ninho aquecido descansa o ovo fecundo da nova criatura e, da alma da artista, surge o deleite dos sentidos humanos, demasiado humanos alguns, como diria meu amado Niezsche. Sua presença è, sono, sei, siamo e siete. Ecco !!! A cortina não se abre, mas a artista já está lá, atuando no erro não errado, descortinando a verdade de quem com ela comunga o momento. É plena, é o próprio sintoma pulsante e pulsionante da obra.


O ator: lá vem ele, ou será que ele já foi? não percebe-se a ida diante da presença que insiste de ser mesmo depois de ter sido. Atua atuando e não é atoa que atordoa os atordoados sedentos do mais querer ver e se aturdir, O bis aqui não se faz necessário, pois o ator já se foi mas não se despediu das mentes inquietas do público. Bravo !!!


O músico: manejando com presteza impar sua caixa de ressonância de forma arredondada, que assemelha-se a uma gota de orvalho, mas às vezes à uma lágrima, seja ela desencadeada por felicidade ou por tristeza, mas enfim, a certa altura do espetáculo, onde a necessidade fisiológica da fome me acomete, lembrava-me ela uma pera viçosa. As vozes do espetáculo não se originaram apenas das cordas vocais dos seus atores, mas também e intensamente do alaúde que não queria deixar de se manifestar e é também por ele que vimos e sentimos os sintomas do eu e do tu e do nós.


A peça: pede-se permissão para iniciar sem início, numa iniciação que já havia iniciado sem permissão e todos se preenchem de comoção. Enfim estamos conscientemente no começo do já começado e, aliviados não erramos com o suposto erro do outro que não errou, mas provocou empatia em todos e, em alguns, distanciamento, noutros agonia e ainda em outros vilipêndio até a compreensão. Quando avisei que Freud estaria presente no evento muitos chalacearam minha pessoa, mas confirmaram que eu falara a verdade, pois a presença de Sigismund Schlomo Freud pode ser sentida pelos sentidos mais dispersos durante o espetáculo, em cada linha, dita e não-dita, em casa gesto e movimento atuado e esquecido. Alguns riram durante algumas partes, do espetáculo? não o sei, mas quiçá do reflexo da própria imagem projetada no espelho chamado encenação teatral. Sim, estávamos numa overdose de sim e não presentes naquele palco, nos movimentos dos artistas e nos sintomas que não queríamos que fossem tão nossos e tão vivos como ali presentes se apresentaram ser. Algum momento, feito túnel do tempo, viemos e nos colocar em 1909 e diante de Freud ao tratar da neurose obsessivo-compulsiva à luz da teoria psico-sexual do desenvolvimento humano. O "Homem dos Ratos" toma espaço e lugar... ratte ratte ratte... e o público graceja e ao mesmo tempo compreende. Permitam-me não me prolongar em pormenores textuais, pois esta peça é digna de ser vista e revista e vista ainda novamente... não desejo ir além do que me é permitido, pois não poderia anuir ser capaz de nomear cada momento, pois o momento é o daquele momento, e não será o mesmo ao assistirem à peça, pois cada um carrega em si as lamparinas da sua identidade manifesta e que irá prover o encontro e desencontro pessoal diante do visto e do que não desejará vir a ver. Assista ao espetáculo e ouse compreendê-lo, ou aos próprios sintomas meus e teus.


Pós cena: se já não bastasse as glórias dramatúrgicas apresentadas, após, o deleite foi com o que a psicanálise de debruça e se faz mestre: a fala. É hora do público falar e falar o já falado mas não compreendido ou o que é querido de se ouvir de novo. E o verbo grita de todos os lados da platéia, a qual questiona mas responde suas próprias questões, pois ousa se ouvir mais uma vez. A troca é recíproca, onde o distante e o perto se impõem como sinônimos possíveis. Onde o profissional e o leigo comungam suas questões, algumas ainda não elaboradas, mas sedentas de virem a ser tão humanas quanto foram desde a mais tenra idade de cada qual. A cortina do palco já havia se fechado, mas o espetáculo continuou... após, o músicos, a atriz, os atores e o diretor já não estão mais lá, e nem nós, mas as cenas insistem em permanecer em nossas mentes atuando sem cessar. Nem precisou, antes de iniciar ao espetáculo, de pedir para que "quebrassem às pernas", pois o espetáculo teve a assinatura do sucesso, pleno de gozo. PARABÉNS !!!



TEMA: VARIAÇÕES FREUDIANAS 1 : O SINTOMA

Cia Inconsciente em Cena (Rio de Janeiro/RJ)
Texto e Direção: Antonio Quinet
Musica: José Eduardo Costa Silva
Encenação: Regina Miranda begin_of_the_skype_highlighting end_of_the_skype_highlighting e Antonio Quinet
Elenco: Aline DeLuna e Ilya São Paulo
Luz: Luis Paulo Neném
Cenário: Aurora dos Campos
Figurino: Luiza Marcier
Produção Rio: André Romam
Produção Joinville: Luciano
Realização: Atos e Divâs Produções

Lçto Nacional: 16 de outubro, às 20h30
Local: Teatro Juarez Machado (Joinville/SC).


Carlos Alberto HANG
www.revistainverso.com.br
twitter @hangjornalista
ORKUT Carlos Alberto Hang (http://www.orkut.com.br/Main#Profile?rl=mp&uid=12179450314487666558)
MSN hangmodels@hotmail.com

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